sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Baile de Máscaras

 


O Carnaval sempre nos abre novas perspectivas sobre o grande baile de máscaras que é a vida . A cada dia,  a cada momento, precisamos pegar no guarda-roupas a fantasia   adequada  ao baile a que somos obrigados a participar.  Na entrevista de emprego, a roupa sisuda e a cara de seriedade e responsabilidade necessária para impressionar o RH; para a solenidade religiosa, as vestes de penitente , a face transcendental, o ar piedoso e casto; na família , o discurso doce ou autoritário, a fácies de mandatário de uma república de bananas; na mesa de bar, o deboche, as conversas rasgadas, o discurso machista, a pose de estraçalhador de corações; no campo de futebol a paixão à flor da pele, o ímpeto pronto ao ataque, como se  num campo de batalha; no trabalho, o ar compenetrado, sério de funcionário padrão. Este grande palco da vida é, assim, um teatro de máscaras e só conhecemos bem o personagem desempenhado por cada um dos artistas no tablado, pouco sabemos da essência real dos atores. Talvez, por isso mesmo, tanto nos surpreendemos e nos decepcionamos com posturas e atitudes de amigos e companheiros de caminhada: Quem diria ? Quem poderia imaginar , com aquela cara de beata !  Santo com pés de barro ! Lobo em pele de cordeiro !

                                    Estamos, a cada segundo dessa vida, desempenhando papéis previamente estipulados. O script , ao nascer, já nos é jogado às mãos, não cabe discutir, apenas decorar as falas , as marcações, as deixas. E, claro, escolher o figurino, a máscara, a maquiagem próprios para cada cena previamente determinada. A dramaturgia já foi escrita pelas igrejas, pelas famílias, pela tradição, pela política, estabelecida cuidadosamente em códigos de ética e de postura. Ensaiando e seguindo direitinho o preestabelecido há a garantia mínima de você alcançar o Sangri-Lá: um empregozinho, uma casa, um amor sinceramente enlatado e um monte de penduricalhos de consumo que nos prometem ser a chave única da felicidade. Mas se você resolver, neste concerto, fugir da partitura, ao invés de executar música clássica , optar pelo Rap, tem fortes possibilidades de ser expulso da orquestra. Talvez você , assim, se sinta mais liberto, mais realizado, com a sensação de estar traçando um caminho pessoal e não o da manada, mas pagará, certamente, um considerável preço por nadar contra a corrente. Como Chapeuzinho Vermelho você tem sempre à sua frente os caminhos do rio ( opção indicada pela tradição)  ou o da floresta e, nesta última trilha, se você escolher, o Lobo Mau estará à espreita pronto para te devorar junto com a vovozinha.

                                    Você poderá optar pelo tédio, como lembrou Baudelaire, ou pelos paraísos artificias: o álcool, o ópio e outros anestésicos que tirem a dor na travessia. E, por isso mesmo, sejam cada vez mais procurados. Eles põem por terra essas fantasias e máscaras impostas e nos permitem observar nossa imagem desnuda, com nossas imperfeições e acertos, sem os filtros fornecidos pela sociedade. Mas é triste sempre imaginar que só é possível suportar a vida conforme nos foi prevista e determinada,  sob anestesia.

                                    Talvez, por isso mesmo, o Carnaval seja uma festa tão amada e querida. Durante quatro dias,  você pode eleger as máscaras e fantasias que irá usar, sem que ninguém interfira. Príncipe, Mendigo, Homem, Mulher, Papangu,  AlaUrsa, Odalisca, Velho do Rio... O Carnaval é o único momento em que você não precisa usar fantasia, você pode ser você mesmo...

 

Crato, 24/02/2022

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