sábado, 29 de setembro de 2018
sábado, 22 de setembro de 2018
sexta-feira, 21 de setembro de 2018
Desordem sem Regresso
Alguns dias
atrás, assistimos aflitos, ao incêndio
que consumiu em chamas o Museu Nacional, uma instituição de mais de duzentos
anos e o baú que acolhia os documentos mais importantes da memória brasileira. Em
meio ao burburinho e às faíscas, procurando lacrar a porta depois de perpetrado
o furto, começamos a compreender a enormidade da perda e enxergar possíveis
culpados na tragédia que nos batia à porta. Governistas lançavam seus dardos envenenados
no governo anterior, derrubado num golpe político-judiciário, sem nem
reconhecer que com isso levaram ao poder a maior excrescência política desde
que por aqui aportaram as caravelas lusitanas. A oposição entregou o troféu
abacaxi nas mãos do atual desgoverno, já assoberbado de medalhas mil: maior
entreguista, maior demolidor de conquistas sociais e trabalhistas e líder
inconteste das malas de dinheiro espúrio.
Em quem deve cair a carapuça ?
O grande
Darcy Ribeiro dizia que a má qualidade
da educação no Brasil não é mero acaso, mas um projeto planejado, azeitado e
executado meticulosamente geração após geração. Que interesse teriam nossos
pútridos governantes em educar a população, acordá-la da sua letargia se isso,
imediatamente, faria com que não mais elegessem seus opressores ? E o pior é
que este projeto é autossustentável e se retroalimenta. Péssimas condições da escola pública, baixo
salário dos professores isso é um programa milimetricamente calculado com fins
de eleger as mesmas classes dominantes e manter a população mais desfavorecida do país na obscuridade. “Pobre só precisa aprender
a consertar fogão !” -- afirmou , recentemente, um dos candidatos a presidente. Com a Cultura não é diferente. Ela, como a
Educação, tem essa capacidade libertária, essa possibilidade de cortar amarras
e quebrar grilhões. Povo educado, povo culto é totalmente avesso a cangas,
vacinado contra qualquer tipo de cabrestos.
O incêndio
criminoso do Museu Nacional não é uma mera fatalidade, um corriqueiro acidente.
Ele faz parte do projeto elitista de destruir o país, de incinerar a memória de
genocídios como o indígena, o da escravidão, o de Canudos. Passado incinerado,
as mesmas hecatombes de outrora podem se repetir agora sem remorsos. Um outro
objetivo é fazer apagar tudo aquilo que
possa se consubstanciar como identidade nacional. Fica , assim, mais fácil
entregar ao capitalismo mundial nossa indústria, nosso petróleo, empresas
estratégicas como a EMBRAER , a EMBRATEL, a Base de Alcântara.
E o problema não se restringe ao que foi o Museu Nacional. As muitas entidades
culturais brasileiras estão sendo jogadas na mesma sucata. Teatros fecham,
salas de cinema se reduzem aos shoppings, que são imunes à pobreza. Basta ver
aqui em Crato a situação do nosso Museu Vicente Leite fechado há vários anos,
sem nenhuma perspectiva de reativação, com um valiosíssimo acervo que incluiu
quase que a pujança das artes plásticas caririenses do Século XX, em risco
iminente e continuado de degradação. Nosso teatro municipal , que nunca mereceu esse
nome, está fechado desde a gestão anterior, sem nenhuma previsão de reabertura. O Centro Cultural do Araripe ,
na REFESA, encontra-se paralisado há anos, sem programação estabelecida,
vivendo de esparsos e raros eventos. Duas salas de cinema prometidas com
alarde, com verba federal liberada, nunca chegaram sequer a ter suas paredes
levantadas em toda a “fenomenal”
administração anterior e nem nessa que herdou , aparentemente, a mesma apatia e
letargia.
O Brasil, em
marcha ré, está prestes a voltar a ser
uma Pindorama, só que agora já sem o pau brasil, o ouro, os diamantes, a cana
de açúcar. Um mero aglomerado de povos
díspares, sem identidade nacional, aculturado, sem nenhum sentido de nação. No
pendão nacional a frase positivista deve ser substituída por : “Desordem sem
Regresso”. Nosso futuro é uma arma quente.
Crato,
21/09/2018
quinta-feira, 13 de setembro de 2018
MATOZINHO EM ARMAS
O Tiro de
Guerra 12-007 instalou-se em Matozinho, sob a batuta inicial do Sargento Perlomeno Fildácio. Fiu-Fiu, como passou a ser
carinhosamente conhecido na vila, apesar
do apelido gaiato, era linha dura. Viera do Rio Grande do Sul, dizia-se de
nobre descendência germânica, mostrava-se intransigente com a disciplina e patriota
de carteirinha e tinha verdadeiro pavor de comunistas. Sem muitos querequequés
não demonstrava nenhum pejo em puxar o fio de teses embasadas no darwinismo
social. Para ele, a qualidade de qualquer pessoa, como a de um cachorro, tirava-se
pelo pedigree. Como diabos podia dar certo um país como o nosso, uma salada de
negro burro vindo da África, índio
preguiçoso e branco bandido expulso de Portugal ? -- perguntava-se,
seguidamente, em voz a três escalas, do alto da sua patente, um Perlomeno de
voz de camelô. Além de tudo, bradava
para seus pupilos, como se ajeita um cabaré como o Brasil , comandado por
políticos corruptos , eleitos muitos com o dinheiro do Crime Organizado ? Para
ele só havia uma solução : uma guerra civil, encabeçada pelo glorioso exército
pátrio, balas e rajadas de metralhadora para todo o lado. Depois, restando
apenas a capitã Eva e major Adão, se começaria tudo de novo.
Fiu-Fiu
, a máxima autoridade militar em Matozinho, começou , então, a treinar os
primeiros soldados da vila que, depois, fariam parte da reserva para futuras
missões de guerra. Utilizando a técnica do esporro, rápido o sargento deu-se
conta da difícil missão que lhe tinha sido confiada. Adolescentes, acostumados
com espingarda soca-soca, baladeira e bodoque, pouco afeitos a horários fixos, a inabilidade para o serviço militar era
flagrante naquele fim de mundo. De grito
em grito, de esporro em esporro, de prisão em prisão, Fiu-Fiu foi aos poucos
tentando pôr disciplina nas tropas. A
primeira providência tomada : a escolha
de um cabo, entre os reservistas, para lhe ajudar na condução dos trabalhos.
Optou por Faustino, um sujeito meio broco,
de Bertioga, mas entroncado e forte, com força de um Ferrabrás. Cabo Faustino tomou ares hierárquicos e começou
a cobrar das tropas exercícios físicos extremados e respeito rígido aos
horários. Numa das festividades do TG, a prefeitura oferecera um jantar à
tropa, em comemoração ao dia do soldado. Faustino, acostumado a comer com as
mãos, fazendo capitão, de repente viu-se diante de instrumentos estranhos que
precisavam ser manipulados na solenidade:
garfo e faca. Tomou um susto e fez a interrogação que achou mais plausível :
--- Oxe! Se
má pregunto : E aqui vocês comem aqui é cum TAIÉ ?
A partir
daquele dia, para sua ira, começou a ser chamado, por seus subordinados, de
Cabo Taié. Talvez, para amenizar mais o
clima, Fiu-Fiu adotou uma cadela, pé-duro que foi aos poucos ficando pelo TG,
incentivado pelo resto de comida que o sargento passou a lhe fornecer. Taié
passou a cuidar de “Pátria Amada” --- esse foi o nome patriótico com que o
sargento a batizou, como se tratasse de uma cachorrinha de madame. Nas marchas
da tropa e solenidades, levava-a sempre à frente, puxada por uma coleira
bonitinha e coberta com uma espécie de roupa onde existia um brasão de armas ,
dos dois lados, e o nome : “Exército Brasileiro”. Adotaram, depois, um cão da
mesma raça indefinida. Alguns soldados propuseram um nome de peixe, como
Traíra, Cruvina ou Baleia, pois isso protegê-lo-ia de hidrofobia. Fiu-Fiu
fincou pé, achou o nome muito peba, e preferiu a nobreza do mar: batizou-o por “Polvo”.
No 7 de setembro, o Tiro de Guerra 12-007 desfilou
brilhantemente pelas ruas de Matozinho. Apresentou, em marcha picada, os
primeiros recrutas gloriosos da Vila. Terminada a solenidade, o prefeito
Salustiano Bandeira mandou chamar o sargento para parabenizá-lo pelo desfile.
Coube ao chefe de gabinete saudar a autoridade militar. Empertigado, com lenço
na mão, em gesto teatral, Adelino de Zé Peitica, assim terminou seu discurso:
--- Matozinho
sente-se feliz e honrada sabendo que agora tem soldados prontos a morrem pela
sua defesa. Obrigado Sargento pela sua inteligência e perspicácia! Atrás de Seu
Fiu-Fiu, eu pergunto, quem somos nós ? Jumentos, sargento ! Rígidos jumentos
prontos para a ação, mas meros jumentos !
Diante da pulsante
ameaça, algo velada e jumentosa, Fiu-Fiu resolveu bater em retirada. Chamou
Taié e quis imediatamente saber onde estava “Pátria Amada”. O cabo deu uma
volta nos arredores e voltou aterrorizado:
--- Sargento, “Pátria Amada” tá no cio e tem uma
ruma de cachorro cobrindo ela. E pior, estão apoiando as batas em cima do “Exército
Brasileiro”.
--- O que ?
Que blasfêmia é essa, Cabo Taié ! E “Polvo”, cadê o “Polvo”? Não toma nenhuma
providência ?
--- O Polvo
parece que é capado, sargento Fiu-Fiu, tá só lá olhando, olhando... e não faz
porra nenhuma !
Crato, 13/09/2018
terça-feira, 11 de setembro de 2018
Assinar:
Postagens (Atom)