quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Natal


Mais uma vez, o final do ano. Os espíritos já se banham nas doces águas do Natal e do Ano Novo. As luzes natalinas iluminam as praças e os jardins. Mensagens emboloradas já circulam pelos correios e pela Internet. O comércio rejubila-se com a consumista solidariedade. Os meninos do Grangeiro já estendem seus sapatos nas janelas na certeza da vinda do bom velhinho. Os da Batateira, tristes e desesperançados, preferem recolher as sandálias, na certeza de que Papai Noel nunca faz escala por lá. Os perus calam seus guglus e os leitões recolhem temerosos seus pernis : serão imolados em sacrifício nos altares natalinos.As famílias durante todo o ano desunidas , com os ares natalinos se tornam reunidas e , em trégua , recolhem um pouco as armas, até o toque de alvorada do ano novo.Lábios sussurrarão preces maquinalmente , num fervor vazio e superficial. Os bares e restaurantes se apinharão de confraternizações: um sem número de empresas reunindo funcionários e criando um momento fraterno e solidário que acabará daqui a pouquinho, embora devesse se estender por todos os dias do ano. Nos templos , homens e mulheres contritos se darão as mãos efusivamente, desejando-se felicidades mil ; as mesmas mãos que logo em seguida se fecharão para os mendigos e se cruzarão no peito para a miséria do mundo. As ceias natalinas, quanto mais fartas, mais prenhes de alimentos estranhos e estrambóticos: figo, nozes,tender, lentilhas, chesters, panettones , champanhe, passas e uvas.Servem mais para alimentar a vaidade dos anfitriões do que o estômago dos comensais. A Ceia que modificou os destinos da humanidade não foi regada apenas a vinho e pão?
As festas trazem sempre consigo alguma atmosfera de tristeza e de saudade. Com o passar do tempo, pessoas queridas já não respondem à chamada. Talvez porque, como dizia Manuel Bandeira, estejam todos dormindo, dormindo profundamente... Um belo dia estaremos sós diante da grande Távora vazia de cavaleiros.Algumas recordações se espreguiçarão a um canto, o passado grávido se debruçará em algum móvel da sala. . Talvez , neste dia, um comensal de longas barbas sente conosco na longa e solitária tábua e divida conosco o pão e o vinho, não mais que isto. Perceberemos então que a mesa se tornou gigantesca , acolhendo nossa nova família que agora possui irmãos de incontáveis cores e raças. Celebram as primícias da vida, com sua essência de fugacidade e de mistérios, enquanto se vai servindo a ceia farta regada pelo milagre dos peixes e dos pães.
17/12/08

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