sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Um Incidente Pavoroso

                                               
As chacinas seguidas que têm acontecido, em presídios brasileiros,  nesses seis primeiros dias de 2017,  dão uma clara ideia do total baratinamento governamental em que vivemos. Brigas de facções, envolvendo o PCC e o Comando Vermelho,  fizeram com que fossem massacrados 60 detentos em Manaus e, em represária,  33 em Roraima. Esta mortes em presídios, em menos de uma semana, representam 25% de todas os assassinatos acontecidos em prisões  brasileiras em todo o ano passado. A partir da calamidade, se sucederam incontáveis e tragicômicas situações sintomáticas de um governo à deriva que não tem ciência de onde veio nem para onde se destina.
                                            A princípio,  a estratégia foi jogar a responsabilidade no Estado do Amazonas e na empresa de Manaus, privada, que administra o presídio. O presidente em depoimento tardio, denominou o acontecido de um “Acidente Pavoroso”. O Ministro da Justiça , de comum acordo, lançou a responsabilidade no Amazonas. A privatização sequer foi questionada.  Devido às repercussões negativas, rapidamente, como é típico dos desgovernos, tiveram que, como sempre, voltar atrás. “Acidente”  seria um evento fortuito e inesperado, dependente do mero acaso. A quem responsabilizar ? O destino, a má sorte ?  Imediatamente o Governo do Amazonas informou que o risco de uma tragédia iminente tinha sido denunciado ao Ministério da Justiça e esse não tinha tomado nenhuma providência. O Ministro teve que se retratar e assumir a imobilidade e suas consequências posteriores, inclusive com o risco de cair.  O desacerto, porém, ainda se agravaria.
                                     Viria o acréscimo ado sco da nossa Reacionariocracia. De repente, a mídia e as redes sociais destilariam o ódio, o ranço, o preconceito tão em voga nos últimos tempos. Até mesmo o governador do Amazonas ! Para todos,  teria sido ótimo o acontecido : mais de cem bandidos a menos ! Bandido bom, como se repete ad nauseam, é bandido morto ! Claro, desde que seja o ladrão de galinha,  pobre, negro e marginalizado. Não entram nessa regra os peixes graúdos de colarinho branco e mesas regadas a vinho e caviar. O corrupto de carteirinha, os manipuladores de super-salários , os filhinhos do papai ,  os sonegadores vultosos, os desviadores dos mananciais públicos, para esses, pobrezinhos, as benesses e frestas das leis !
                                               Tão iníquas como esse pensamento obtuso , pré-histórico e anticivilizatório,   foram as medidas  anunciadas pelo governo para resolver o holocausto nas nossas prisões. Construção de mais cinco presídios ! Eles não seriam suficientes sequer para cobrir o déficit de vagas na região Norte! Se construídos as prisões ( e sabe-se lá quando !) só abateriam em 0, 4% as necessidades atuais.  O presidente do STF também visitou o Amazonas e apenas se certificou da explosão da bomba de pavio curto que já sabia acesa há muito e muito tempo. Todas essas medidas propaladas não mexem com a raiz do problema da violência e criminalidade, são endereçadas apenas à repressão que sabemos secularmente não têm qualquer capacidade  de minorar a situação.
                                      É imprescindível entender verdades que recusamos engolir. O Crime Organizado no Brasil é mais organizado que o governo instituído. Eles controlam as prisões brasileiras , o tráfico, as favelas, os morros. São eles que mandam e desmandam nos presídios, que estabelecem as regras internas, aliciam a polícia , políticos e membros do judiciário. Fazem revoltas quando assim o desejam e armam chacinas ao seu bel-prazer. E mais: nos estados mais importantes, o governo se curva às facções criminosas , negociam com elas, liberam uso de celulares, aceitam regras de não transferência de presos. Eles causam tantos acidentes pavorosos quantos quiserem sem que o estado , manietado, tenha condições de abrir o bico.
                                     As mortes acontecidas nos presídios são responsabilidade do estado. Se não temos condições de dar segurança aos detidos, é nosso dever liberá-los. Nem adianta pensar que a Pena de Morte acontecida, ao arrepio da lei, pode resolver o problema. Já existe a pena de morte nas ruas, instituída pelo Crime organizado e pelo desorganizado , até agora, a questão apenas tem se agravado. Não é o Tribunal Carandiru que irá  deixar o país mais seguro e mais justo. Infelizmente vamos dando as costas agora a um destes agravantes desencadeadores, que sei, não é único : a Desigualdade Social.
                                   Todos aqueles que agora felizes curtem as mortes com um indisfarçável ar de prazer e de vingança  devem lembrar que a mesma sanha que pôs as Facções Criminosas umas contra as outras pode, em um futuro bem próximo, os unir para vir , mais uma vez, cobrar nas ruas , com juros de sangue e sofrimento, as contas que se vêm juntando secularmente no pavoroso banco das relações humanas brasileiras. Será a carnificina, neste momento, mais uma vez,  catalogada como Acidente Pavoroso ?

Crato, 06/01/2017

                                      

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