“Um público comprometido com a
leitura é crítico , rebelde,
inquieto, pouco manipulável e
não crê em lemas que alguns fazem passar por ideias.”
Um dos primeiros sintomas do advento das tiranias é a perseguição e
queima de livros. Heine dizia que logo depois do incineração das páginas começam a queimar seus autores.
Essa regra é um claro diagnóstico do poder revolucionário do livro e sua
capacidade de mudar os rumos do planeta. No Brasil , que volta a sonhar novamente
com as piras, dá para se ter uma percepção nítida das causas da tragédia que
nós próprios semeamos. Dados de 2011 do IBGE mostram que apenas a metade da
população tem o hábito de ler. Em 2017 o brasileiro lia menos de dois livros e
meio por ano ( nos EUA são mais de cinco e na França, sete). O hábito de ler tem uma relação direta com a renda familiar,
com o grau de escolaridade, com a vida urbana e com a juventude. Além de tudo,
dados de 2017 demonstram que mais de 7% da população ainda são de analfabetos e,
mais, acredita-se que mais da metade da população brasileira não
tem um nível de alfabetização considerado básico. Dados de Oxford apontam que
as chances de uma mulher com leitura ter um cargo profissional alto aumenta de
25 para 39% e , no caso do homem, de 48 para 58%. A leitura, amigos, tem uma
relação direta com nossa ascensão humana e profissional e com a possibilidade
de mudar o mundo à nossa volta. Por isso, a Educação é revolucionária e
libertadora e, compreensivelmente, perseguida
com o massacre da escola pública, os baixos salários dos professores, o
patrulhamento de aulas e disciplinas. Político corrupto , eleito pelas elites
econômicas do país, vai incentivar o crescimento humano e político do povo para
nunca mais ser eleito ? Como dizia o prof. Darcy Ribeiro : o sucateamento da escola
pública no Brasil não é um mero acaso, mas um projeto de governos.
Ah ! Mas no
meio desta catástrofe, existem sempre iniciativas que nos trazem alento e nos
permitem pensar num futuro diferente e num mundo mais justo e solidário. As
grandes transformações no curso da humanidade dependem muito mais de pequenas
iniciativas de visionários do que das grandes convulsões sociais. Vêm da Minas de Tiradentes , de Rosa e
Drummond ventos promissores. Pessoas que sonham ser possível borrifando seu orvalho matinal,
apagar os incêndios da floresta. Basta que este hábito seja seguido por outros
borrifadores e o orvalho possa se tornar chuva torrencial. Há quase vinte anos,
um professor de Língua Portuguesa, aposentado, ao visitar a escola onde havia
trabalhado em Belo Horizonte, descobriu estupefato que os alunos e até os novos
professores simplesmente não conheciam a Literatura Brasileira. José Mauro
Costa teve a ideia de juntar outros colegas, arregimentar escritores e
publicar, anualmente, um livro adulto e um outro infantil, distribuindo
gratuitamente , todo ano, na Praça da Liberdade em BH, hoje na de Santa Tereza,
numa grande festa da cidadania. Os números do feito são impressionantes: mais
de 350.000 exemplares doados à população e o envolvimento de quase 230
escritores das mais diferentes regiões do Brasil, inclusive este pobre escriba.
O projeto terminou por disseminar-se por outras cidades do país e até já
aconteceu em Montevideo e em Toronto.
Este ano , ele
aporta aqui em Crato, quando se espalhará na Praça Siqueira Campos, no próximo
sábado, dia 5 de Outubro. Vem com a chancela do Instituto Cultural do Cariri,
com um cartel de 66 anos de serviços prestados à nossa cidade e o apoio da
Secult/Crato, do Estúdio Caravelas, do Instituto Fernando Sabino de Belo
Horizonte, do CEJA/Crato , do Rapadura Cuturarte. Pretende, nas edições
seguintes, perpetuar-se, envolvendo os escritores caririenses, nesta grande batalha
pelo incentivo à leitura e ao amor aos livros . No fundo, percebemos que bem além
do simples ato de ler, chega junto a possibilidade quase única de transformar
destinos e vidas e reconstruir um país que, mal começou seu tortuoso processo
de construção, já se encontra em pleno estado de desmoronamento...
Crato,
02/10/19
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