O Brasil, último
país a acabar com a escravidão,
tem um perversidade intrínseca na sua herança,
que torna a nossa
classe dominante
enferma de
desigualdade, de descaso.
Darcy Ribeiro
Este período eleitoral desvendou
uma face do país bem diversa daquela que vimos apregoada por nossos mais
famosos sociólogos e antropólogos. Como entender que a nação mais cristão do
mundo, em pleno tempo do Papa Francisco, se veja com ganas de cão
hidrofóbico, com ataques sistemáticos ,
com a aparente catarata da autoridades constituídas, às eternas minorias de
gays, pobres, negros, nordestinos ? Onde
ficou guardada a Bíblia, em que gaveta se esconderam os rosários e os crucifixos? Observando ,
friamente, as hostes bárbaras ao nosso derredor, parece que estamos vivendo uma
reprise alemã dos anos 20-30, com milícias armadas aterrorizando as ruas; com
discursos inflamados tomando de assalto
as mídias televisiva e social, pregando, sem nenhum pejo e pudor: o assassinato
sistemático de adversários políticos. Adiante vê-se o armamento aberto e
despudorado de uma população totalmente despreparada para portar sequer uma
baladeira; o assalto a todos os direitos da população trabalhadora; a ameaça de
fechamento do Congresso e do retorno à Cortina de Chumbo dos tempos
ditatoriais; o abandono do grosso da população brasileira, a miséria, à fome, à
doença e ao extermínio; a substituição de fatos e notícias
por fofocas cabeludas disseminadas pelos Gobbels de plantão. E o mais
insensato e incompreensível em tudo isso, como na Solução Final, do Nazi
fascismo, com o beneplácito da população
burguesa, mas, incrivelmente, com enorme respaldo também naqueles que, logo
mais, estarão diante do pelotão de
fuzilamento. Poderemos ter -- tempos loucos ! -- uma ditadura mascarada, ao
arrepio da Constituição dita cidadã, instalada com o respaldo das urnas, sob a
eterna justificativa ( aí a receita sempre se repete) de combate à corrupção,
ao ateísmo, às distorções morais. Falta apenas, no nosso projeto de Fascismo tupiniquim, o exacerbado patriotismo , antes
tão prevalente nas casernas, mas, agora, incompreensivelmente, substituído por uma lúbrico e desbragado
entreguismo. Sempre é bom lembrar que se a porta de entrada para tempos
ditatoriais aqui poderá ser pelo voto, a saída sempre faz-se demorada, penosa,
aberta com golpes de baioneta e, a história tem mostrado, com muitas baixas do
lado daqueles que não portam as armas de guerra.
Temos
que conviver, neste Brasil, em pleno Século XXI, com discursos pré-iluministas. A Escravidão passa a ser
novamente perfeitamente justificável; as questões ecológicas são mero
atravancamento ao progresso humano; os pobres , como os índios, merecem seu
sofrimento e extermínio por conta da preguiça desenfreada; os Caldeirões, os
Canudos são novamente resolvidos com rajadas de metralhadoras . Onde
escondeu-se, envergonhada , a propalada cordialidade do brasileiro, um dia
apontada pelo nosso Sérgio Buarque ? O elogio à nossa miscigenação, como pedra
de toque da nossa grandeza humana, que tanto nos fez pábulos , nas palavras de
Gilberto Freyre, como escafedeu-se tão sorrateiramente ? Por que . agora, de
manhã acendemos uma vela aos santos e, à noite, como lobisomens , saímos para nossos rituais satânicos ?
Faltam
poucos dias para que, definitivamente, aclare-se esta bipolaridade que invade
nossa alma. Somos um projeto de Nação, com o longo caminho a ser percorrido
ainda, em busca de acolher toda a população como irmãos, sob o manto da
liberdade e da cidadania ? Ou apenas um mero aglomerado humano, cuja
sobrevivência se rege pela lei do mais forte e do mais poderoso, sem rumo, sem
alfa, nós selváticos e selvagens : chacais e lobos de nós mesmos ?
Crato,
11/10/2018
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