Nordestinos, somos seres de duas
estações. O pêndulo das nossas almas cicla entre estes dois polos: verão e
inverno. Vezes no gris do estio, vezes no verde da invernada. Para nós, tempo
bom significa relâmpagos, trovões e torreame. Nossos corações, órfãos de
estações, primaveram com as chuvas e
outonam com o sol abrasador. Divididos entre o alento e o desencanto, as
intempéries da seca nos abatem mas não nos derrubam. A tristeza da estiagem
sempre será recompensada pela alegria multiplicada da futura fertilidade
invernosa. O nordestino sabe que a felicidade está guardada mais na esperança
rediviva do que no paiol com seus cíclicos movimentos de cheio-vazio.
Enfrentando
os verões, por vezes sucessivos, nosso espírito acinzenta-se como toda a
natureza, mas, nos primeiros pingos promissores de chuva, saltamos da terra como os sapos, levantamos
voo como as tanajuras, florescemos igualzinho aos marmeleiros. O matuto,
calejado e temperado nos rigores do
clima, não se exaspera fácil. Carrega consigo aquela resignação quase mineral
dos rochedos. Aprendeu com os juazeiros, com a palma, com os mandacarus , as
lições do florescer e do resistir. Às
vezes, pode até parecer morto, seco e desfolhado como os umbuzeiros em outubro.
Mas aquilo é sempre um recuo tático, uma sofisticada estratégia bélica. Nas raízes,
guarda a essência líquida da
sobrevivência e, nos primeiros borrifos de chuva, cobrirá, rapidamente, a
nudez, com o verde fosforescente do vestido de gala , próprio para a festa que se
anuncia.
Nordestinos, compreendemos
também as aulas da economia e da parcimônia. Neste pêndulo, o exagero de hoje
pode significar a escassez do dia seguinte. Apesar de tudo, o matuto depreende
que somos todos passageiros de uma mesma arca e que não há côdea de pão que não
possa ser dividida em múltiplos pedacinhos para o regalo de muitos. Há mais
solidariedade na escassez do campo do que na fartura do arranha-céu.
Talvez,
escanchados nesta vida pendular, terminamos por entender que a felicidade não é
um adereço de superfície , como uma maquiagem. Verão e Inverno , como
crepúsculo e aurora, tornam-se apenas fases do ciclo natural de nossas vidas.
Na roça, aprende-se a valorizar os mais simples frutos que a existência faz
brotar na nossa colheita. Por que se exasperar ? O amargor de hoje é tão
somente o prenúncio do mel que provaremos amanhã. E o contraste agridoce
transforma-o numa iguaria mais leve e
saborosa ! A treva faz-se apenas a esperança do albor que já começa a esticar
seu pescoço na linha do horizonte. Se hoje acordamos verão, de noitinha
adormeceremos inverno. A vida fica mais una na dualidade das estações.
Crato,
13/04/18
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