Imantados do ciclo
natural da vida, do moto-contínuo dos solstícios e equinócios, percebem, sem ânsia e sem atropelos, que o botãozinho logo mais eclodirá inundando
o mundo com seu aroma e seu colorido. Dias depois, o pólen será espargido ao mundo pelas borboletas,
difundindo o sêmen criador; logo depois,
a florzinha murchará, as pétalas
ressequidas cairão uma por uma na terra , adubando o solo e realimentando o
manacá nas futuras frutificações. Há uma mão invisível lançando o bumerangue da
vida, entre auroras e crepúsculos, primaveras e verões, entre o grão e o pomo, o gênesis e o apocalipse.
A rocha, próxima ao
broto pendente, a princípio, pode empanturrar-se de empáfia, arvorando-se ares de eternidade.
Afinal está ali fixa , estática e praticamente com a superfície imutável há
séculos e séculos. Vestiu-se apenas de algum limo no transcorrer de muitos
anos. O botão do manacá , fatalissimamente, na sua mutabilidade, se trajará de
cores, se borrifará de perfumes inebriantes para um baile único , fugidio e efêmero.
A rocha, na sua louca presunção, nem
sequer percebe que o desaparecimento do botãozinho, após a festa , é apenas momentâneo
e que ele voltará , logo depois, multiplicado, trajando muitos outros vestidos
e adereços para o sempiterno bailado da existência. É que a vida monta-se na
mutabilidade, no corcel arrisco do
efêmero. Viver é continuamente trocar roupas e figurino para o ininterrupto bailado
da vida.
O Cariri, nesta
semana, se viu chocado e entristecido quando uma das flores mais almiscaradas
do seu manacá feneceu e caiu por terra. D. Newton havia preenchido de cor e
aroma nossa paisagem urbana por muitos e muitos anos. Chegamos a imaginar que ,
como a rocha do nosso jardim, seria imarcescível. Esquecemos, por um momento, que a vida carrega
consigo , como irmã siamesa, a mutabilidade que se nutre do transitivo e do
fugaz. Abatemo-nos ante a flor despetalada,
mas é preciso entender que a árvore continua firme e intacta e que o pólen
acabou de ser distribuído copiosamente pelos campos opimos. Seu exemplo, sua lembrança, seu testemunho
humano continuarão brotando nos nossos pés de serra, encantando-nos com suas
cores e com sua fragrância.
Crato,
07/04/17
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