J. FLÁVIO VIEIRA
O filósofo espanhol José Ortega Y Gasset dizia que a opinião contrária à nossa faz parte integrante da nossa verdade e ajuda a se compreender melhor as nuances do mundo. Voltaire vaticinara, já no Século XVIII, que mesmo não concordando com nada do que alguém dissesse, ele tinha o dever de lutar até o fim pelo direito daquela pessoa emitir sua opinião. Ou seja, quem pensa diferente de mim, em verdade, não é meu inimigo: sua visão de mundo junta-se à minha para que eu compreenda melhor as diversas nuances do universo. Valho-me desses luminares das Ciências Humanas, neste momento em que a Brasil anda tão polarizado. O país , de repente, se pôs nos dois extremos da reta e esqueceu que a virtude, como diziam os latinos, está num ponto equidistante das extremidades. Tenta-se resolver tudo com o ódio, o rancor, a fúria, a violência , a agressão.
Neste período eleitoral, então, as paixões extremas, de lado a lado, se tornam mais visíveis, palpáveis e perigosas. Chega , inclusive, em homicídios como aconteceu aqui em Crato. Tudo seria fácil de resolver se, relegados os interesses pessoais, estivéssemos todos lutando por um país melhor e mais justo, utilizando apenas caminhos diferentes. Entendo que a tolerância quanto à opinião contrária à minha não é não só salutar , mas enriquecedora. Nada mais deletério para a vida do que a visão maniqueísta, a verdade única de manada, a unanimidade. Existem, no entanto, questões humanísticas inegociáveis e intoleráveis. Aquelas que nem precisam ser levadas à discussão, mas combatidas ferozmente. A Tortura, o Fascismo, o Genocídio, o Racismo, o Holocausto, a Ditadura, por exemplo. Estas são algumas daquelas questões que se assemelham a um Câncer da sociedade, cujo tratamento não está no campo da retórica, mas da cirurgia de extirpação.
Estamos, no momento, prestes a realizar as eleições municipais. Num Brasil tão polarizado, os debates têm substituído as palavras pelas cadeiradas, denúncias rasteiras e ameaças de morte. E os atritos ficam bem mais frequentes porque a disputa é no nosso jardim, no nosso quintal. Sei que , nesse momento, o cidadão comum não se volta para o coletivo. Ele é pragmático aqui, em São Paulo, do Oiapoque ao Chuí. A coletividade é uma abstração. Ele pensa diretamente em quem pode melhorar sua qualidade de vida, seu rendimento, sua habitação, seu acesso à saúde, educação, quem pode diminuir seus custos com impostos, taxas, etc. Embora sonhássemos num mundo melhor, onde o bem comum estivesse acima do individual, essa é a realidade que temos em mãos.
Volto, no entanto, àquilo que na vida me parece inegociável. Impossível escolher um candidato sem quaisquer traços de humanismo. Fascistas, racistas, xenófobos, ditadores, afanadores declarados e orgulhosos, mentirosos convictos e presunçosos, são figuras desprezíveis que não merecem sequer fazer parte da convivência humana, quanto mais liderarem a tribo. Este ano o Crato, uma cidade libertária, comemora os duzentos anos da Confederação do Equador. Esperamos que o sangue dos Confederados que deram a própria vida por uma nação mais justa e igualitária, ainda continue a correr nas veias dos seus descendentes. Fascismo, não !
Crato, 02 de Outubro de 2024
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