Como não se emprenhar da pequenez do planeta, visto através do translúcido
filtro do sítio ? Para o pinto os
horizontes não terminam na casca do ovo
? Ali, a lua cheia beijava-lhe o terreiro em reverência quase que religiosa. As
estrelas refletidas na lâmina do açude podiam ser bebidas com a concha das mãos
e o sol , onipresente, morava no quarto da frente, envolto no seu cobertor de
fogo e de luz. Até o outro mundo percebia-se convidativo ,ali defronte, num cemiteriozinho improvisado, perto da casa,
com suas cruzes tronchas e suas flores murchas. Talvez, por isso mesmo, a vila
saltava-lhe aos olhos como um estorvo, uma outra longínqua galáxia.
Madalena
ouvia, vez por outra, falar de terras estranhas e distantes. Recife, Rio, São
Paulo...Na sua escala, no entanto, não deviam ser locais tão remotos. O Oiapoque
terminava no pequizeiro defronte da casinha de taipa e o Chuí iniciava-se longo
adiante , no fim do quintal. Os
feirantes , vorazes engolidores de estrada, falavam das terríveis e penosas
viagens a muitas lonjuras. Madalena, no entanto, assegurava-os, alimentando o
riso de muitos, que atrás de sua casa tinha uma veredazinha que era pertinho de
todo canto deste mundão de meu Deus. Na feira, o povo mangava daquela
pretensão, daquele portal particular da roceira e apelidaram a vereda de : “Caminho
de Madalena”. Queriam que algum fazedor
de mandado se apressasse? Sapecavam:
---
Vá pelo Caminho de Madalena, viu ?
Se
alguma pessoa chegava atrasado num trato, a pergunta fazia-se inevitável :
---
Por que não veio pelo caminho de Madalena ?
Diferentemente
de Liliput, no entanto, aos olhos de Madalena era o mundo que se revelava microscópico
e não as pessoas. Os homens e as mulheres desnudavam-se enormes e coloridas talvez como um contraste natural
ao opaco-cinza do restante da aquarela. Os sonhos, também, tantas e tantas
vezes, trespassavam as fronteiras daquele mundinho, a contragosto
da sonhadora, e deslindavam-se para além dos limites extremos do pequizeiro e do
quintal fazendo-se palco mais que
suficiente para o enredo de uma vida. E
aos poucos se ia aprendendo que nas muitas viagens, físicas e sentimentais, empreendidas na existência, nesta contínua
corrida de obstáculos , pode-se buscar,
sempre, um atalho menos penoso, uma via
mais expressa: um Caminho de Madalena.
Crato,
22/11/13
2 comentários:
Sua crônica me faz admirá-lo TANTO, pois muitas vezes me reconheço em suas SÁBIAS palavras. OBRIGADA pelo blog e pela existência do EXCELENTE escrivinhador que há em você.
Abraço Yanayana e obrigado pelas palavras carinhosas
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