Cá estamos em plena Semana Santa, já sem o glamour de tempos passados. Algumas cidades brasileiras aproveitam o feriado da sexta feira para armar grandes festas perfeitamente profanas. A maior parte do povo perdeu a ritualística cristã e já não sabe bem o que significa o feriadão. Empanturra-se de vinho e aparenta um ar de santidade e transcendência. As crianças ligam imediatamente a páscoa ao coelhinho e ao chocolate. As classes mais desfavorecidas aproveitam a oportunidade para abastecer um pouco a despensa vazia e saem mendigando víveres para um jejum cada dia mais raro e distante. Os comerciantes entendem a santidade desta semana como o momento oportuno para aumentar o preço do peixe e do bacalhau e levar um pouquinho mais ao caixa da empresa. Nas igrejas os santos se cobrem de roxo talvez mais pelo absurdo total do que vêem a sua volta do que pelo peso plúmbeo e culposo da memória terrível da crucificação.
Desde os tempos de juventude que a quaresma me suscita a imagem de Pilatos. Sei que o nome Pilatos hoje remete imediatamente à academia de fisicultura. Os mais jovens lembram-se de pronto daqueles aparelhos para malhar e sair por aí bombados e impressionando a garotada com músculos mais definidos. Assim, preciso explicar : falo de Pôncio Pilatos. Bem, ele foi prefeito da Judéia entre 26 dC e 37 dC . Teria passado totalmente despercebido dos livros de história se não houvesse participado de um dos mais importantes julgamentos de toda a história. Pilatos foi o juiz do processo de Jesus e terminou acatando a opinião da maioria e ao lavar as mãos condenou-o ao suplício no Gólgota. A sua decisão manchou definitivamente a sua história e, certamente, contribuiu para um julgamento histórico implacável de todas as condutas da sua vida. Tido como violento, venal, corrupto e de uma ferocidade sem limites em todos os júris que participou, segundo os historiadores Filão e Flávio Josefo. Nos séculos seguintes surgiram inúmeras lendas envolvendo o seu nome. Desde um final desastroso em Tevere ou em Vienne na França, o suicídio em 37 dC; até sua conversão ao cristianismo, influenciado por sua esposa Prócula que é considerada santa pela Igreja Ortodoxa. Ele mesmo foi santificado pelas Igrejas etíope e copta. O “Credo”, oração surgida em torno de 200 dC, no entanto, lhe macula definitivamente a memória : “ padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado...".
Em tempos de tanta liberalidade nos rituais religiosos da Semana Santa por parte da população, me ponho a imaginar o papel singular de Pilatos em toda a história sagrada ocidental. A primeira questão a ser levantada por tantos juízes de plantão é simples. Se todo o suplício de Jesus estava pré-estabelecido, inclusive previsto por profetas, é possível que o papel de Pilatos assim, também, estivesse determinado e que ele apenas tenha sido um veículo necessário à confirmação da profecia e dos desígnios divinos. Mesmo afastando esta hipótese, nos coloquemos no papel do juiz romano. Julgava um prisioneiro político que não conhecia e , como no direito romano, seguiu a opinião dos jurados. Opor-se seria, em tempos atuais, afastar-se da decisão do corpo de jurados e tomar uma decisão unilateral, um verdadeiro absurdo jurídico na visão contemporânea. Mesmo assim , Pilatos hesitou na sentença e preferiu tirar o corpo de fora. A posteridade escolheu o caminho mais cômodo e lhe imputou a culpa pela crucificação. Em nenhum momento se volta para a grande turba que preferiu Barrabás e que ano após ano, julgamento após julgamento, continua politicamente escolhendo sempre a pior parte.
Basta olhar em volta, em meio aos tonéis de vinho consumidos, ao comércio do jejum, às festas profanas reverenciando o sagrado, para se perceber que se Cristo voltasse, se o julgamento fosse hoje, a crucificação se repetiria. Os que hoje fazem a multidão e o corpo de jurados são descendentes fiéis de Barrabás. Pilatos ao menos lavou as mãos, os juízes de hoje as tingiriam, rapidamente, de rútilo sangue inocente.
Desde os tempos de juventude que a quaresma me suscita a imagem de Pilatos. Sei que o nome Pilatos hoje remete imediatamente à academia de fisicultura. Os mais jovens lembram-se de pronto daqueles aparelhos para malhar e sair por aí bombados e impressionando a garotada com músculos mais definidos. Assim, preciso explicar : falo de Pôncio Pilatos. Bem, ele foi prefeito da Judéia entre 26 dC e 37 dC . Teria passado totalmente despercebido dos livros de história se não houvesse participado de um dos mais importantes julgamentos de toda a história. Pilatos foi o juiz do processo de Jesus e terminou acatando a opinião da maioria e ao lavar as mãos condenou-o ao suplício no Gólgota. A sua decisão manchou definitivamente a sua história e, certamente, contribuiu para um julgamento histórico implacável de todas as condutas da sua vida. Tido como violento, venal, corrupto e de uma ferocidade sem limites em todos os júris que participou, segundo os historiadores Filão e Flávio Josefo. Nos séculos seguintes surgiram inúmeras lendas envolvendo o seu nome. Desde um final desastroso em Tevere ou em Vienne na França, o suicídio em 37 dC; até sua conversão ao cristianismo, influenciado por sua esposa Prócula que é considerada santa pela Igreja Ortodoxa. Ele mesmo foi santificado pelas Igrejas etíope e copta. O “Credo”, oração surgida em torno de 200 dC, no entanto, lhe macula definitivamente a memória : “ padeceu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado...".
Em tempos de tanta liberalidade nos rituais religiosos da Semana Santa por parte da população, me ponho a imaginar o papel singular de Pilatos em toda a história sagrada ocidental. A primeira questão a ser levantada por tantos juízes de plantão é simples. Se todo o suplício de Jesus estava pré-estabelecido, inclusive previsto por profetas, é possível que o papel de Pilatos assim, também, estivesse determinado e que ele apenas tenha sido um veículo necessário à confirmação da profecia e dos desígnios divinos. Mesmo afastando esta hipótese, nos coloquemos no papel do juiz romano. Julgava um prisioneiro político que não conhecia e , como no direito romano, seguiu a opinião dos jurados. Opor-se seria, em tempos atuais, afastar-se da decisão do corpo de jurados e tomar uma decisão unilateral, um verdadeiro absurdo jurídico na visão contemporânea. Mesmo assim , Pilatos hesitou na sentença e preferiu tirar o corpo de fora. A posteridade escolheu o caminho mais cômodo e lhe imputou a culpa pela crucificação. Em nenhum momento se volta para a grande turba que preferiu Barrabás e que ano após ano, julgamento após julgamento, continua politicamente escolhendo sempre a pior parte.
Basta olhar em volta, em meio aos tonéis de vinho consumidos, ao comércio do jejum, às festas profanas reverenciando o sagrado, para se perceber que se Cristo voltasse, se o julgamento fosse hoje, a crucificação se repetiria. Os que hoje fazem a multidão e o corpo de jurados são descendentes fiéis de Barrabás. Pilatos ao menos lavou as mãos, os juízes de hoje as tingiriam, rapidamente, de rútilo sangue inocente.
Crato, 10/04/09
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