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Talvez estes gêmeos não se tornem tão famosos como alguns dos seus antecessores : Rômulo e Remo , Cosme e Damião, ou os mais recentes de Angelina Jolie e os de Fátima Bernardes. Mas existem alguns sinais que eles vêm anunciar um novo tempo. Primeiro acordamos para o fato da complexidade da família no mundo atual. Longe vai aquele tempo da célula familiar rígida e constituída por um pai, uma mãe e muitos filhos. Hoje a organização da família é muito mais complicada. Envolve filhos de diferentes casamentos, pais, padrastos, mães, madrastas, sogros e sogras vários, avós e avôs tortos e de linha direta, cunhados e cunhadas múltiplos. Não bastasse isso cada dia se torna mais freqüente o casamento ( ainda não legalizado , por enquanto) de pessoas do mesmo sexo, envolvendo filhos adotados ou, no caso de Noé-Esperanza e Munira-Adriana, filhos biológicos. E todos temos que nos preparar para essas mudanças inevitáveis. É preciso se despir dos antigos e arraigados preconceitos para não ser atropelados por eles. A sociedade precisa se adequar aos novos tempos , nas suas leis, nos seus códigos, nas suas ações cotidianas. Imaginem Munira e Adriana buscando registrar os filhos no nome de duas mães , será permitido? E se mais adiante, resolvem se separar, quem deterá a guarda dos filhos ? E se por acaso o dono do sêmen utilizado na fertilização resolver reivindicar o direito de pai, como se resolverá essa pendenga ? No caso de Noé, ele é mãe e pai do filho ao mesmo tempo, como será feito o registro dos seus gêmeos ?
Uma outra realidade bem clara nos bate à porta. O Século XX com um impulso fenomenal nos rumos do conhecimento humano e da Ciência tornou obsoletos todos os Códigos de Ética . Vivemos um vazio deontológico. Os Códigos da Bioética, do Bio-direito, da Moral e dos Costumes, os Códigos religiosos mais que quaisquer outros, não conseguem acompanhar a avassaladora realidade dos novos tempos. Descriminalização das Drogas, Fertilidade In Vitro, Clonagem, Transgênicos, Direitos de Minorias, Desospitalização dos pacientes psiquiátricos, Eutanásia, Aborto, Pesquisa –tratamento com Células Troco, Manipulação genética de embriões, Eugenia, controle de Armamento Nuclear, são apenas alguns pequenos desafios do último quartel de Século. Os desafios são tão grandes que ninguém se atém mais a questões que nos parecem menores. Quem , neste mundo de meu Deus, além do papa, proíbe o uso de camisinhas aos filhos? Quem, fora os Testemunhas de Jeová, se preocupa com as transfusões de sangue ? Quem ,além dos rabinos, discute a circuncisão no nascimento ou a ingesta de carne suina? Quem considera pecado, hoje, fora do dogmatismo da igreja, o uso da pílula ou da laqueadura de trompa ou da vasectomia ? Se repararmos bem, todos os códigos já não respondem a nossas questões básicas, se é que um dia já responderam. Hoje é impossível tentar encontrar em qualquer código uma resposta definitiva para os desafios da modernidade, como se se tratasse de uma receita de bolo.
Mais que nunca precisamos nos afastar do relativismo da ética e buscar uma visão mais universal e, antes de tudo, estabelecer um vai-e-vem reflexivo com toda a sociedade. Se eu me prendo ao meu relativismo sou obrigado a aceitar o relativismo do outro e o relativismo na ética é um pântano, entrando nele, nunca mais se consegue escapar da sua areia movediça. Claro que qualquer comunidade pode estabelecer suas regras de conduta internas, desde que em comum acordo com todos seus membros. Ninguém, no entanto, tem o direito sagrado de criticar regras estabelecidas por outros povos, usando critérios histórico-culturais diferentes. E, antes de tudo, ninguém tem o direito de interferir no estado, seja de que maneira for, no sentido de empurrar de goela abaixo seu código pessoal para outras pessoas que não fazem parte da mesma comunidade.
Talvez os gêmeos que ultimamente têm nos despertado para os terríveis desafios éticos dos novos tempos queiram nos dizer bem mais. A humanidade toda está grávida de uma nova verdade e esta prenhez, amigos, é gemelar, de quíntuplos, sêxtuplos, ou infinítoplos e os gêmeos, possivelmente, não são univitelinos. Os novos rebentos, as nova verdades, não serão únicas e indissolúveis e terão a carinha do pai : este tempo amorfo e eternamente mutável.
27/03/09
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